quarta-feira, 21 de julho de 2010

Um não lugar - a portaria.

Ah, como faz tempo que não posto resolvi me animar depois do trabalho de hoje. Este inventário começou a ser desenvolvido no intuito de recolher narrativas de vida de migrantes nordestinos em São Paulo, e pelo viés da memória, construir uma dramaturgia que falasse do exilio vivido quando se desterritorializa-se. Encontrei um problema, não havia recorte no que estava propondo. Pensava em ir a São Miguel Paulista, bairro da Zona Leste de São Paulo, recolher histórias de nordestinos, visto que São Miguel é um bairro formado pela migração nordestina. ???????????? Sapos coacham na minha mente. Estou perdindo no pântano de minhas pretensões. Uma luz já se apresentava e eu ainda não havia dado conta, pois já vinha conversando com vários nordestinos radicados em São Paulo e não havia percebido que todos eles eram porteiros de edificios e condominios da cidade. Bingo!!!! Recolhi nove histórias de nordestinos que moram em São Paulo, todos porteiros de edificios e condominios. Descobri na portaria um não-lugar. Um lugar de passagem. Um lugar em suspenso, tão caracteristico da vida de um ser migrante. Um migrante é aquele que vive a todo tempo buscando territorializar-se no lugar que escolheu para viver, e nisso, muitas estratégias são criadas. Desde casar-se com uma mulher da mesma cidade a constituir vilas, comunidades e bairros inteiros onde pode se preservar um pouco da sua memória. A conversa com os porteiros mostrou que a portaria é um não-lugar, assim como o do migrante nesta selva de pedra (é como eu e tantos que conheço se sentem), onde a partir da memória os porteiros relembram toda sua história de vida, a trajetoria até aquela portaria, e almejam, em sua grande maioria o desejo de voltar, que resume-se ao desejo de ser feliz. Como diz Joseph Campbel quando fala do mito do Herói o ser humano é esse herói por excelencia desde quando nasce, visto que ali está sua primeira ruptura, sua primeira migração, ele é lançado ao mundo para vencê-lo, e assim, continua sua jornada. Migramos sempre, eu acredito. Seja territorialmente ou mesmo internamente, mas buscamos sempre sair de um lugar ao outro dentro e fora de nós mesmos no intuito de ser feliz, e ao mesmo tempo, estamos fadados a experiencia material do corpo, que horas liberta, em outras aprisiona. Assim como na portaria... O tempo passa, o dia inteiro e sentado atrás do balcão: Sebastião, Severino, Manoel, Rosenildo, Antonio, José, Marco, Heronildes e Antonio voam dentro de suas imagens poéticas de infancia, e eu, do outro lado da câmera me debato como artista-manipulador na busca de que eles traduzam as minhas histórias. Viva a palavra que chicoteia o ar e diz não!

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