terça-feira, 23 de março de 2010

Uma Carta para Dizer que fui a Guerra

A pesquisa de grupo foi a base para a construção de minha prática. O contato com e
ética de trabalho em grupo se deu através dos três anos de trabalho junto do Grupo de Teatro Clowns de Shakespeare (Natal/RN). O afastamento do grupo me colocou em contato direto com o caos e a crise tão necessários a construção de um pensamento estético quedespontava no revoar de meus devaneios.
Enquanto vivemos em grupo conseguimos nos proteger nas muralhas que criamos
para sustentar nossas bases. Acredito numa política publica para teatro, consequentemente, num teatro público subsidiado pelo governo. A falta de caminhos para a renovação e alimento para meus questionamentos no Rio Grande do Norte, fizeram-me seguir adiante. Buscar fora das terras de poty água para matar minha sede. Na distância reencontra-se,constantemente, as lembranças.
O exílio é um encontro as avessas com a terra, que até então havia se perdido dentro
de mim. A memória foi o caminho encontrado para sustentar minhas pernas em meio ao
movimento dos carros e sombras dos prédios. A memória de tudo e de todos. A partir daí,surge o desejo de se debruçar sobre os recônditos da memória no afã de revelar “quem somos” nesse país de tantos. A saudade, herdeira da memória, é o sentimento condutor dessa redescoberta de minha identidade. Nasce a idéia de gerar um questionamento mais amplo sobre identidade cultural em conflito com a realidade cosmopolita, através da memória. No campo de estudo da memória, percebe-se a sua importância na formação cultural, nos diz Danilo Santos de Miranda em Memória e Cultura, a importância da memória na formação cultural humana, publicada pela editora SESC/SP em 2008:
... a memória, vincula-se, sobretudo, ao potencial transformador e à apreensão que se faz dos conteúdos propostos, à possibilidade de congregar beleza e crítica, entretenimento e formação de valores.
A cultura não se limita à preservação das identidades e tradições, mas relaciona-se com o modo de integração social e de superação de desigualdades, de autonomia dos indivíduos e das coletividades, no âmbito dos costumes, tradições, idéias e valores, modos de vida, de subsistência e existência. A cultura, continuamente construída, transformada e cultivada, deve considerar o imaginário, a criação estética e a reflexão como bens essenciais à sua formação. Ao mesmo tempo, a memória também se constitui pela interação de aspectos sociais e afetivos.
A memória se constrói a partir de acontecimentos arquivados, sejam eles bons ou
maus, mas sem sombra de dúvida, marcantes. Entender essas marcas pelo prisma da
história real, da formação da nossa identidade através do processo de colonização e
formação desse país iniciado pela região nordeste, dos acontecimentos pós-guerra, do
êxodo rural, do processo migratório em tempos de seca, em conflito com as histórias
pessoais de nordestinos que se afastaram de sua matriz cultural e genealógica é o caminho apontado nesse inventário de impressões descobertas na distância.
João Júnior.
Natal, 24 de Julho de 2009.
03:42 hs.
P.S: Meus olhos estão cheios de areia do mar aguardando o sono para me banhar.